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IFRS: mais transparência entre empresas e acionistas
Imagine sair do médico com um terrível problema de saúde diagnosticado e saber que o remédio só vai ficar pronto no ano seguinte, diante da falta generalizada de conhecimento sobre a doença em questão.
Imagine sair do médico com um terrível problema de saúde diagnosticado e saber que o remédio só vai ficar pronto no ano seguinte, diante da falta generalizada de conhecimento sobre a doença em questão. Com certeza, o desespero se instalaria em você.
Guardadas as devidas proporções, é assim que se sente hoje grande parte da classe contábil e, por conseguinte, pequenos e médios investidores diante das muitas dúvidas ainda presentes dois anos depois de publicada a Lei 11.368, das S.A. Entre elas, o porte exato das empresas às quais essas novas regras se destinam, aspecto básico na definição quanto à sua real aplicabilidade.
A própria Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em nota recém-divulgada, reconhece ser muito difícil que o novo modelo se aplique já no primeiro trimestre de 2010, o que levou a autarquia a sugerir a aplicação provisória dos padrões atualmente vigentes tendo em vista a demora com que a agenda envolvendo a migração de uma realidade para a outra tem sido divulgada.
Essa decisão pode ser considerada acertada, pois traduz o desejo de boa parte de quem trabalha nos departamentos financeiros das empresas em busca de um pouco mais de tempo para poder se atualizar em relação às normas internacionais de contabilidade, cuja complexidade não se pode desprezar.
Altamente ilustrativo desse cenário é o número de contadores contestando a tese de que as normas IFRS devam ser adotadas, inclusive, pelas micro e pequenas empresas, à luz da Resolução do Conselho Federal de Contabilidade (CFC). Foi o caso de um conhecido profissional da área, com atuação no Sul do país, cujo título de um artigo recém-publicado já diz tudo: "Novo padrão contábil - um delírio".
Aos investidores, em especial aos pequenos, também não faltam motivos para interrogações a esta altura, pois geralmente eles não recebem todas as informações necessárias sobre a empresa nas quais estão colocando dinheiro. Nem devem imaginar, por exemplo, que o fato de uma entidade vender um ativo a um terceiro com a documentação indicando a transferência legal da propriedade não significa, propriamente, a inexistência de acordos paralelos assegurando o usufruto contínuo dos benefícios econômicos gerados por esse bem.
Nessas operações, até a futura recompra é possível e por um montante próximo ao valor original acrescido apenas dos juros de mercado pouco tempo depois. Em outras palavras, reportar a transação numa circunstância assim não representaria adequadamente o negócio efetivado, comprometendo, com isso, a veracidade da informação levada tanto à contabilidade quanto aos acionistas da empresa.
As normas IFRS estão sendo implantadas também para solucionar essa falta de transparência entre as empresas e os pequenos acionistas, uma relação que certamente será transformada nessa nova etapa da história da contabilidade mundial, em que pese, repito, ser no mínimo inconveniente a pressa numa implantação de tal complexidade.
Paralelamente, não se pode negar também que será dado um novo impulso à gestão empresarial com todas essas mudanças elevando, sem dúvida, o grau de confiança dos investidores externos. Os que tiverem participação irrelevante na tomada de decisões, por exemplo, poderão acompanhar com mais proximidade os passos da administração, a fim de coibir possíveis deslizes, como os registrados no passado recente com grandes e famosas corporações.
Voltando à questão sobre quais entidades realmente serão obrigadas a aplicar as normas IFRS em 2010, vale lembrar o parágrafo 44 da Resolução CFC 1.121/08 (Estrutura Conceitual para a Elaboração e Apresentação das Demonstrações Contábeis), que coloca o equilíbrio entre custo e benefício como "uma limitação de ordem prática, ao invés de uma característica qualitativa", já que as vantagens decorrentes da informação devem exceder o custo de produzi-la.
Diz ainda o dispositivo que esse aspecto é, basicamente, um exercício de julgamento, no qual deve-se sempre levar em conta a relação custo-benefício de uma forma ampla, e não apenas para atender à conveniência dos usuários para os quais as informações são preparadas.
Por esse raciocínio, o fornecimento de dados mais detalhados e precisos aos credores, por exemplo, seria uma forma de reduzir seus custos financeiros, além de deixar os investidores bem mais seguros quanto à situação verdadeira do negócio ao qual confiam suas aplicações.
Aspectos assim tornam evidente que as resoluções do Conselho Federal de Contabilidade devem ser seguidas por contadores e empresas, contanto que se respeite a real validade dessa decisão, já que em 99% das pequenas entidades as resoluções do CFC que tratam da internacionalização contábil são tecnicamente perfeitas e sustentáveis, porém dificilmente aplicáveis.
Marco Antonio Papini é sócio-diretor da Map Auditores Independentes, empresa associada à CPA Associates International